De língua morta o latim não tem nada. Vejam, por exemplo, quantas expressões são usadas em Direito. Quem nunca ouviu falar de habeas corpus? de alibi? de data venia? O latim não está de forma alguma morto, está no nosso dia-a-dia: quem nunca mandou um curriculum vitae? Quem nunca ouviu falar de renda per capita? Ou pensou em fazer uma pós-graduação lato sensu? Ou ouviu que alguém é doutor honoris causa? Quem nunca fez um P.S. ao fim de uma carta? Ora, isso também é latim: post scriptum. Essa antiga língua de Roma está nas tecnologias mais modernas, está na fecundação in vitro, no fax (abreviação de fac simile, que significa “faça de maneira semelhante”, não é isso que faz o fax?). Mesmo muitas palavras importadas do inglês remontam ao latim: na Informática usa-se o verbo deletar, do inglês to delete, que vem, por sua vez, do verbo deleo em latim, que significa “destruir”. 

De tão entranhado na nossa língua, o latim até se confunde com ela: idem é latim, a expressão grosso modo também (por isso, é errado dizer “a grosso modo”), o supra summum, o et caetera, até a expressão vulgo, quando dizemos José Carlos vulgo Zeca. E há muito, muito mais: expressões como a priori, alter ego, causa mortis, ex libris, exempli gratia, Homo sapiens, in continenti, in loco, ipsis litteris, lapsus linguae, modus vivendi, mutatis mutandis, pari passu, persona non grata, ad hoc, sine qua non, scilicet, sic, status quo, carpe diem, sui generis, ab imo pectore, tabula rasa, vade mecum, vade retro, Aedes aegypti, só para citar as mais comuns, dão um sabor todo especial à redação de um texto e - por que não? - à fala, sem falar de provérbios como alea jacta est, cogito ergo sum, mens sana in corpore sano.

Portanto, aprender ou não o latim não é a questão. Ele já convive conosco, pois é a alma de nossa língua e bastaria reconhecê-la. Com o latim, vemos que as irregularidades e as temíveis exceções das gramáticas não são nem irregulares, tão pouco exceções. Tudo passa a ter uma lógica mais clara e previsível.

Mário Eduardo Viaro, A importância do Latim na atualidade, Revista de Ciências Humanas e Sociais, 1:7-12, 1999.