Palavras, palavras, por Luís Fernando Veríssimo
Palavras, palavras, por Luís Fernando Veríssimo
"Corrupção" vem do latim "rumpere" ou romper, quebrar. "Corrumpere" quer dizer quebrar completamente, inclusive moralmente, o que significa que quem foi corrompido não tem mais conserto, não importa o que diga a sua eleitoral. O mais inquietante, no entanto, é que da mesma origem latina vem a palavra "rota", através de "ruptura", que virou "rupta" no latim vulgar, um caminho aberto ou batido, e que está na origem do francês "route", de "rota", e também, que Deus nos ajude, de "rotina". "Corrupção" e "rotina" se reencontram no português brasileiro do século XX.
Aqui nenhum corrupto vai para a galeria. Que no caso vem do italiano para prisão, que vem da mesma origem de galea", um tipo de barco, como "gale", e não de galeria, que é uma palavra engraçada. Sua origem é a Galileia da Bíblia, em hebreu "galil hagoyim" ou lugar dos "goys", dos incréus. Depois virou o átrio das igrejas medievais, onde presumivelmente também ficavam pessoas segregadas, e acabou na alegre "galeria" italiana onde todos se encontram. E Brasil virou "galera", que é a anti-Galileia, um lugar de crentes fanáticos, pela menos no seu time.
Denúncias de corrupção lembram a ótima palavra "sincofanta", que hoje é o nome de quem nos assegura que o governo vai, sim, punir todos os culpados pelos escândalos, e, se ficar provado que o próprio governo é o maior culpado, ele se entregará ao Tuma, mas antigamente queria dizer informante ou, em grego, aquele que mostrava onde estavam os figos. "Sukon" era figo e "phantes", o que mostra. Isto porque havia um extenso tráfico de figos na época e os ladrões ou contrabandistas da fruta eram perseguidos pelas autoridades e as investigações sobre as suas atividades eram levadas às últimas consequências, presumivelmente a morte pela imersão em algum tipo de calda. Enfim, sempre os hortifrutigranjeiros!
Quem busca as origens de palavras pode, muitas vezes, se ver atacado elas, por trás. O francês que foi investigar a origem do anglicismo "cocktail" pensando descobrir alguma coisa envolvendo o galo, seu rabo e muita safadeza acabou descobrindo que a palavra vem de "cocktay", uma corruptela, na língua "creole" do Sul dos Estados Unidos, de "coquetier", que é cálice para ovos - em francês. O que não impediu de continuar pedindo "un coctel!", sempre que quer um "dry martini ou "un old fashioned" antes de comer "un biftek", que vem do inglês "beefsteak", ou steak de "beef", corrupção inglesa do francês "boeuf". Aliás, esse mesmo francês, enquanto jogava golf acompanhado de "un caddie", palavra que vem da Escócia mas só estava lá de passagem, pois é uma adaptação do francês "cadet", comentou que esteve no México e se maravilhou com as bandas de "mariachis", sem saber que "mariachi" vem de "mariages" pois era a música tocada nos casamentos durante a ocupação, exatamente, francesa. E esse mesmo francês quando usa “les jeans" não sabe que a palavra vem da pronúncia inglesa de Gênes, Genova em francês, pois era lá que fabricavam o tipo de tecido usado nas primeiras calças. O que só serve para provar não sei bem o quê.